janeiro 30, 2008

Persépolis

Persépolis é sem dúvida uma das melhores coisas que li nos últimos tempos e sua adaptação para o cinema é magnífica. A animação é co-dirigida por Marjene Satrapi, autora da história em quadrinhos que a ele deu origem.
Trata-se de um passeio autobiográfico pela infância, adolescência e a fase adulta de uma iraniana nascida numa família progressista que, na virada dos anos 70 para os 80 se vê cercada pela revolução islâmica e o cerceamento das liberdades individuais em prol do fundamentalismo religioso estatal.

No meio disso tudo, Marjene cresce e aprende, tentando a qualquer custo se insurgir e viver, seja por meio da cultura pop, de um jeito de usar o obrigatório capuz para mostrar um pouco mais o rosto ou, acredite, meramente andar com o namorado em público: contrapontos que para nós ocidentais parecem tolos, mas são sutis coquetéis molotovs atirados contra o sistema que submete sua geração e o restante de seu povo.

Essa produção franco-iraniana carrega o senso crítico, desenho de produção reverente ao traço underground, o drama, poesia e humor na medida certa, fazendo jus à obra original e a trabalhos como o jornalismo em quadrinhos de Joe Sacco e os testemunhos contra a guerra dos quadrinhos Gen e Maus.

Ah, para não perder a pegada da adaptação animada, deixe pra ler os quadrinhos depois. Mas não deixe de ler: é muito emocionante e imperdível!

Exibido na Mostra de Cinema de São Paulo de 2007, Persépolis está programado para estrear no circuito comercial brasileiro em 14 de fevereiro de 2008.

Enquanto não rola:

Baixe o torrent do filme (falado em francês)

Baixe a legenda em português

Veja o trailer:

janeiro 14, 2008

Minha lava é para a menina dos olhos marinhos

Na vila os cães uivam - até encher o saco
à lua imponente que cresce
no céu lavado de temporal.

Ainda que menos, ainda está quente.
Mais quente será aquele chatô
Modesto e charmoso ladeando o Una

Ou eu só olho pro lugar errado
Ou todos estão presos ensimesmados
Só sei que São Paulo é antártica sem você

Eu tremo lembrando da nesga que me tomou
o sol das três da tarde que saiu verde
pelo teu olho até o meu, e me sequestrou

Foi tanto, é tanto e faz tanto
Que é como uma lava impetuosa,
Um escudo isento de razão

Meu escafandro de lava
Me afunda e ameaça:
Morra! Renasça!

Mas foi tanto, é tanto e faz tanto
Que o visto voluntário
Pra afundar mesmo: sei meu destino.

Ir às suas profundezas,
seu cárcere marinho
Vou encantado, mas revoluto

Me enche de fúria histórica
Ouvir sua doce voz
sem minha balaclava e o ar

Submersa, uma sirena, violenta
Me arranca lágrimas quando me invade
Como uma cauterização de ouvido

Mas foi tanto, é tanto e faz tanto
Que surgimos daquela mesma célula
Que ainda que a pressão me mate, te entendo

Viemos do mesmo elemento.
Eu não posso fazer nada, só senti-la profundamente
São Paulo é antártica sem você

Então, de repente, pára seu grito
Quebra seu vidro
Sai pra brincar comigo

Quem me dera ser da minha conta o lugar dessa chave
Mas pouco importa: o planeta vai esfriar um dia,
Meu magma por você, nunca

Bom é quando você enche o peito de ar
Arranca seu rabo de peixe
E foge comigo pro mundo dos vivos

Então - longe daquelas profundezas frias
Temos sol, temos lua, temos chuva, gatos e bruxas
Temos voz, qualquer bobagem parece Nina

Foi tanto, é tanto e faz tanto
Que até te ouvir xingando os cães do Nilo
É música na Sampantártica

Rogo: mate seus monstros marinhos
Eu sempre sei onde você está!
Você está sempre, sempre, sempre comigo!

Mate seus monstros marinhos e vem brincar comigo
O Atlântico não é um abismo
É uma imensa lente de aumento

Por ela vejo que minha lava -
Nesse mar besta de umbigos -
É para a menina dos olhos marinhos

Vini Gorgulho
14 de janeiro de 2008
[Para Helô, minha companheira de vida]

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